HISTÓRIAS, CIDADES, PATRIMÔNIO E CULTURA: VIAGEM DE ESTUDO

Data da Publicação: 27/06/2019


HISTÓRIAS, CIDADES, PATRIMÔNIO E CULTURA: VIAGEM DE ESTUDO

Drª Adriane Pesovento

            Muitas coisas a sala de aula e os professores ensinam. Conteúdos, discussões, leituras, debates acadêmicos e produção de ciência, contudo, há outras “ciências” que as vezes não são alcançadas pelo dia a dia da universidade, entre elas: viver e sentir lugares, ouvir pessoas e conversar com elas. Ler o patrimônio histórico à luz dos autores e dos sentidos dados aos lugares históricos que resistem em existir e nos mostrar que o passado reside no presente e “co-habita” a contemporaneidade.

            A viagem de estudo, realizada entre os dias 20 e 24 de junho de 2019 com estudantes do curso de Licenciatura em História foi um espectro dessa dimensão do ser estudante da graduação. Na proposta realizou-se visitas às cidades que apresentam vestígios do passado. Optou-se por estudar o período colonial e sua face e relação com parte da Capitania de Mato Grosso, espacialidade que compunha a América Espanhola, mas que aos poucos, por meio da geopolítica de expansão foi se alargando e recriando fronteiras que ultrapassavam os limites estabelecidos pelo Tratado de Tordesilhas. Desse modo, por meio de uma política luso foi se redesenhando a América Portuguesa, que com o tempo tornou-se o que hoje conhecemos como Brasil.

            Foram realizadas visitas e arguições em cidades como Vila Bela da Santíssima Trindade – MT, primeira capital da então Capitania de Mato Grosso que no século XVIII tornou-se palco dos propósitos portugueses, às margens do Rio Guaporé afluente do Madeira. Na oportunidade conheceu-se as ruínas da então Matriz da Cidade, os estudantes tiveram o privilégio de ouvir D. Nemésia, mulher negra empoderada que em seu lugar de fala mostra a presença africana em terras da Amazônia. A mesma, detalha a festa do Congo, o Kanjinjin (bebida típica e única no país) e reafirma que a negritude é parte marcante da história desse país.

            Em gesto de delicadeza, toca os estudantes colocando-lhes em suas cabeças, o capacete da festa do Congo, os turbantes com seus incríveis amarrados e trançados. Ela toca os estudantes e é profundamente tocada por eles, levarão para vida, essa dimensão da cultura.

            Num segundo momento, realizou-se visita a cidade de Cáceres, fundada no governo de Luiz de Albuquerque de Mello Pereira e Cáceres, então denominado Vila Maria (a categoria de Vila no período colonial, significava ter um status político e eclesiástico diferenciado dos arraiais). Lá o acervo reúne patrimônio que denota ao período colonial, todavia, com as sobreposições de períodos como o século XIX e XX. Ruas estreitas, casarões que a janela bate a rua, calçadas estreitas e matriz ao centro. Na praça, o Marco do Jaru, do outro lado o suntuoso Rio Paraguai.

            Descendo para Cuiabá, a expectativa aumentava e aos poucos era saciada por cada monumento, igreja, casarão, rua, estátuas, artes plásticas, arte “rupestre urbana”. Visita ao Museu de Arte Sacra com peças dos séculos XVII, XVIII e XIX. A cidade, hoje uma metrópole insiste em valorizar seu passado, lugares restaurados que avivam o olhar do espectador. Na Companhia de Artífices, hoje sob os cuidados do Sesc, viu-se o belo do ontem em diálogo com as possibilidades do presente, um espaço cultural que valoriza a música, a dança, o teatro, a leitura e o simples estar no lugar e repousar viajando em pensamentos. Cuiabá que não foi a primeira capital, mas que reunia condições para tanto, hoje mostra-se imponente, pujante e ocupa a parte mais central da América do Sul. O calor companheiro da baixada cuiabana foi gentil com os estudantes da Universidade Federal de Rondônia e tornou as caminhadas menos penosas aos transeuntes de Rondônia.

            Já se aproximando o findar da viagem, um grande presente: Chapada dos Guimarães, o caminho é cartão postal, não há palavras para explicar a beleza que o tempo esculpiu em suas rochas e geografia de cerrado.

            A cidade colorida e linda. O artesanato reina por todo lado. A igreja de Santana acalma e acolhe, seu acervo colonial preservado, data de 1779 e ainda hoje observa e é observado por aqueles que lá passam, a comunidade a mantém não apenas como patrimônio, mas como constituinte da vida cotidiana, as tradições religiosas são realizadas toda semana e a vida segue comunicando o passado com o presente.

            O paladar e a culinária é constituinte da cultura e da história de um povo, só não percebe quem não tem tempo para pensar nas delicadezas e belezas do cozinhar e se alimentar. O sabor ficou na memória degustativa: rosca da festa de ramos (Vila Bela) mais do que alimento é arte em forma de gostosura, o kanjinjin com suas receitas secretas (afrodisíaco para o amor e também para a dor da escravidão) e a comida no fogão de lenha mexida e remexida por mãos de cozinheiras hábeis e amorosas. Tudo é história.

            Célestin  Freinet  educador do bom senso, já dizia que aprendemos por meio de todos os sentidos, nesse caso destaca-se:  ouvir, ver, sentir, comer, falar, tocar, caminhar, chegar e pensar. Essa é a síntese da proposta, a história está além dos muros das universidades e no nosso caso só foi possível pois a Universidade Federal de Rondônia, o Campus de Rolim de Moura, o Departamento de História e os estudantes como protagonistas não mediram esforços para que a experiência ocorresse.

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